
Conta o meu pai que, nos anos 60, testemunhou histórias do “Salto” em que os emigrantes ilegais que saíam de Trás-Os-Montes, em busca de melhor sobrevida noutros países, pagavam aos passadores para encetarem uma jornada clandestina que os levaria para fora de uma geografia minada de injustiça e opressão. Um dos homens, ao despedir-se rumo a França, quis aprender a falar francês, apenas o imprescindível: du pain et des pommes de terre. Pão e batatas. De contrabandista em contrabandista, passavam as fronteiras do espaço exterior e do espaço interior, como se o caminho que percorriam mapa afora estivesse encostado a um caminho que faziam por si adentro, de tal forma que não era possível fazer a viagem esperada sem fazer a mais imprevisível de todas: a interior. Passavam tormentas grandes, concentradas em detalhes. A espera diurna fazia parte da fuga noturna. Esperavam, de roupas molhadas, num espaço mais apertado do que a incerteza. Deitavam-se escondidos num palheiro dez ou mais homens...